quinta-feira, 22 de outubro de 2009

HPS: ultrapassando os limites do suportável.

O descaso é evidente. Não é necessário mais do que uma rápida visita para perceber, e sair com a sensação de que algo profundamente errado está acontecendo com o Pronto Socorro Municipal de Porto Alegre.

A primeira sensação que se tem, e que infelizmente é comum em grande parte dos serviços públicos de saúde, é uma sensação de descontrole e de um certo grau de desorganização. Que são, ao nosso ver, determinadas, principalmente, pela superlotação permanente na qual vive o hospital e pela insuficiência de pessoal técnico e administrativo para dar conta do atendimento.

Essa combinação, acrescida da permanência prolongada de pacientes por uma absoluta falta de leitos em hospitais de retaguarda, coloca os pacientes do HPS em situação de risco iminente, porque favorece a disseminação e contaminação dos mesmos por infecções hospitalares graves.

Creio fundamental que se quantifique, por exemplo, o déficit de pessoal, para que não pareça que estamos falando de coisas não quantificáveis.

De acordo com números informados pela Associação dos Funcionários do HPS, o déficit de pessoal é de aproximadamente 350 trabalhadores. Deste total, 77 são médicos, 15 enfermeiros, 126 técnicos de enfermagem, 13 técnicos em radiologia, 15 motoristas - SAMU, 09 operadores de rádio transceptor, 04 técnicos em segurança do trabalho e outros profissionais administrativos. A redução de médicos é mais sentida nas áreas de traumato-ortopedia, oftalmologia, otorrinolaringologia e anestesiologia.

Outros problemas graves e que se arrastam sem uma solução previsível, são a falta de equipamentos adequados e de preservação do patrimônio físico do hospital.

Por outro lado, por incompreensível que possa parecer, existem dois Convênios efetivados entre a Secretaria Municipal de Saúde em nome do HPS, e o Ministério da Saúde, cujo objeto é a Reforma do pavimento térreo e a reforma e ampliação parcial do segundo pavimento, no valor total de R$ 6.742.464,38, respectivamente firmados em 2004 e 2005, que tiveram sua vigência prorrogada diversas vezes e que, até o momento, não foram utilizados em sua integralidade.

Sem sombra de dúvida, o fator decisivo para que o Hospital de Pronto Socorro não tenha, até o momento, entrado em situação de colapso, é a verdadeira relação de apreço, dedicação e compromisso com a saúde pública que os seus trabalhadores têm demonstrado.

Com a palavra o gestor municipal da saúde.

Lucio Barcelos
Médico Sanitarista

domingo, 4 de outubro de 2009

Sugestões ao Ministro Temporão:

Caro Ministro. Em primeiríssimo lugar, creio que enquanto permanecer escamoteada a relação público/privada no debate sobre a saúde, não vamos chegar a lugar nenhum. Ou pior, corremos o risco de assistir a situação deteriorar-se cada vez mais. A estrutura de recorte universal, referida em seu artigo publicado recentemente em ZH, para funcionar do ponto de vista dos interesses da maioria da população, pressupõe, pelo menos, duas coisas:
Primeiro: que essa estrutura (hospitais, clínicas, serviços de meios diagnósticos, laboratórios, produção de medicamentos, outros insumos e equipamentos), venha a ser, de fato, pública/estatal, como está previsto na Constituição Federal – arts. 196 a 200 – e que os serviços sejam diretamente executados pelo poder público, como ocorre nos países onde existe um sistema universal, tal qual o Canadá, a Inglaterra, etc.
Segundo, que o pedaço público do sistema, que hoje é amplamente minoritário, pare de funcionar para atender aos interesses do setor privado da saúde. A chamada lógica interna do sistema drena todos os recursos para a área privada, seja em quaisquer das formas que se apresente: a) de políticas de subsídios ou de isenções tributárias; b) de transferência dos serviços, eles próprios, por meio de mecanismos de terceirizações; c) de contratações precárias; d) de aviltamento dos salários pagos; ou, ainda, e) de ausência de incentivos para a organização da produção própria de medicamentos e equipamentos pelo Estado.
Por fim, minhas sugestões:
O senhor poderia propor ao governo um acerto com as grandes multinacionais de medicamentos e/ou de equipamentos médicos para que reduzissem em 0,1% a sua taxa de lucro, que, como sabemos, é das maiores que existem. Da mesma forma, o governo poderia ajustar com as empreiteiras que executam - ou vão executar - as grandes obras do PAC, a diminuição em 0,1% do (super)faturamento nas obras por eles empreitadas. O mesmo procedimento poderia ser adotado com os banqueiros, que cobram da população até o ar que ela respira. Ou, ainda, o governo poderia condicionar a anistia da dívida concedida ao setor do agronegócio ao pagamento de uma taxa de 0,1% para aplicar na saúde, ou reduzir em 0,1% o percentual do superávit primário e aplicá-lo na saúde.
Por último: ou o Estado assume, em sua totalidade, o sistema de saúde, ou não teremos saúde decente para a população.