sexta-feira, 5 de março de 2010

Artigo publicado na edição da Zero Hora de 05 de março de 2010.

Estado, para quem? por Lucio Barcelos*

Então, é assim que funcionam as coisas: o governo do nosso Estado retém R$ 164,7 milhões de transferências da União, que deveriam ser gastos em saúde (matéria da ZH do dia 3 de março), aplica esse dinheiro no mercado financeiro, para render juros e garantir o malfadado “déficit zero” e deixa a população, que já está sendo atendida precariamente, em situação mais crítica ainda. Nunca é demais relembrar que o governo do Rio Grande do Sul é o que aplica os menores percentuais (em torno de 5%, quando deveria aplicar 12%) de seu orçamento em saúde. A combinação desses fatos permite que se comece a entender por que as emergências dos hospitais vivem superlotadas, por que é tão difícil conseguir acesso a exames complementares, leitos especializados e a medicamentos no sistema público de saúde do Estado.

Para dificultar ainda mais a vida da população que depende exclusivamente do SUS, a Secretaria da Saúde de Porto Alegre, que nos últimos tempos se especializou em terceirizações e em negócios mal explicados, não nomeia e nem contrata pessoal próprio já faz muito tempo. Não é por outra razão que a secretaria (não) funciona com um déficit de mais de mil funcionários, dentre os quais mais de 250 médicos.

É um quadro desolador, que deve fazer com que a população se questione sobre a real necessidade de um Estado que, nos dois primeiros meses deste ano, arrecadou R$ 200 bilhões (esta é a soma da arrecadação de impostos pelo governo federal, pelos governos estaduais e municipais) e não consegue, minimamente, resolver os problemas mais elementares da sociedade, como é o caso da superlotação das emergências hospitalares, dos episódios de violência urbana e dos surtos epidêmicos – o mosquito da dengue, segundo autoridades da área, será vitorioso sobre a sociedade, até que se consiga criar uma vacina contra o mesmo. É inacreditável que um argumento desse tipo seja usado por autoridades sanitárias. Significa dizer que, em pleno século 21, não temos meios e técnicas capazes de controlar o mosquito da dengue.

Assim, reforça-se na população a ideia de que o Estado é um aparelho incompetente, pesado, corrupto e desnecessário. Uma triste e incontestável verdade que se choca diretamente com os interesses gerais da população. Alguém deve estar lucrando com isso. Certamente, não é a grande maioria da população.
*MÉDICO SANITARISTA, CONSULTOR DO MINISTÉRIO DA SAÚDE

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