segunda-feira, 28 de junho de 2010

Estamos postando Artigo da advogada Maria Izabel Cattani, publicado no Jornal das Missões do município de Santo Ângelo

Violências contra o magistério (II)
Maria Izabel Cattani
izabelcattani@cattani.adv.br


O assunto volta à tona após noticia do último dia 16 sobre o assalto que uma professora sofreu dentro de uma sala de aula em uma escola estadual de ensino fundamental de Porto Alegre. Teve grande repercussão na imprensa do Estado. Exemplos: Juremir Machado da Silva (Correio do Povo,17/06/2010) escreveu: “Vida de professor transformou-se em atividade de alto risco”. Continua: “A situação é tão melancólica, para bem e para mal, que o assaltante não tinha munição (só um velho revólver). Roubou R$ 10,00 da professora. Essa quantia diz muito, diz tudo, grita como o sintoma de uma doença grave, um mal que está aí, bem aí, mas vai sendo empurrado com a barriga”. E mais: “Talvez a professora assaltada seja uma pessoa sensata, aos 58 anos de idade, e não vá para a escola com muito dinheiro na bolsa. Ou quem sabe, escolada, como todos nós, carregue apenas o dinheiro do transporte e o dinheiro do ladrão. Mais provável é que uma professora, na metade do mês, não tenha mais do que R$ 10,00 para carregar no bolso. Esse é o estado das coisas, o estado ao qual chegamos, o caos”. Paulo Sant’Ana (ZH,17/06/10) diz: “Para se ter uma idéia da penúria das professores, ela só tinha R$ 10,00 na sua bolsa e entregou-os ao ladrão. Que crise!”. Também nesse mesmo jornal (16/06/10) Humberto Trezzi afirma: “O diferente, nesse caso, é que a violência do aluno contra a professora do bairro Jardim Floresta se manifestou por meio de um assalto. Em 25 anos de profissão, jamais li ou ouvi falar de ato semelhante. Mas outros tipos de violência, sim, abundam na relação aluno- professores”. Ora, além da violência física e verbal que os professores vêm sofrendo nas escolas, há aquela orquestrada pelas políticas governamentais que não priorizam a educação e que são, sem dúvida, a origem desses fatos agora lamentados pelos jornalistas. Portanto, a violência não é só na “relação aluno-professores” conforme comentado mais acima, mas governos-professores, o que não é novidade nenhuma. Os professores há muito tempo vêm lutando contra essa situação de desprezo do Estado e de alguns setores privilegiados da sociedade. Não é por acaso, pois, que a coluna de hoje tenha o mesmo titulo da que foi publicada em 04/04/09 quando já comentávamos sobre as muitas violências contra o magistério. Entre elas, dizíamos que a política salarial é a primeira das formas de violência contra o professor, eis que o salário é parte integrante da carreira. Em uma sociedade em que perversamente o dinheiro é um valor máximo, essa situação fulmina injustamente a dignidade profissional dos mestres, pois é um meio iníquo de não reconhecer a sua fundamental, indiscutível e indubitável função social na formação de todos os cidadãos. Da mesma maneira, as demais conquistas dos educadores estão ameaçadas: o plano de carreira com a tal meritocracia, as formas democráticas de educação e as de formação e atuação na sua vida profissional e sindical, entre outras. Neste quadro, o assalto sofrido pela professora em plena sala de aula é mais um, portanto não o único, dos agravantes na atual situação da educação pública do Estado.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Artigo publicado na edição da ZH de 07 de junho de 2010 .

ARTIGOS

A diferença de classe e a dupla porta, por Lucio Barcelos *

A ação impetrada pelo Conselho Regional de Medicina do RS e aprovada pelo Supremo Tribunal Federal, reeditando a famigerada “diferença de classe” nas internações e demais procedimentos em hospitais contratados/conveniados pelo Sistema Único de Saúde, representa mais um ataque ao já fragilizado sistema público de saúde em nosso Estado e em nosso país.

Essa prática, que chegou a vigorar no início dos anos 90, foi banida do sistema, pelo simples fato de atentar frontalmente contra a Constituição Federal, rompendo com os preceitos elementares de igualdade de tratamento entre os usuários do SUS. Assim, acumulam-se medidas que dificultam cada vez mais o acesso da ampla maioria da sociedade brasileira que, por pobre, não pode pagar diferença de classe. Esse movimento tende a favorecer a parcela da população que detém planos de saúde. Planos que, em sua grande maioria, não são mais do que simulacros, verdadeiros “atravessadores” do SUS, desrespeitando suas diretrizes básicas. Dessa forma, de medida discricionária em medida discricionária, cristaliza-se uma situação que é o inverso daquilo que o sistema público, ao ser criado, pretendia eliminar.

Só para lembrar, em setembro de 2008, ingressamos com uma representação junto ao Ministério Público Estadual e Federal, questionando a existência da chamada “dupla porta” de acesso dos pacientes aos hospitais contratados pelo SUS.

A dupla porta é, de fato, uma expressão do tratamento discricionário que é dado aos pacientes do SUS em relação aos segurados dos “planos de saúde” que utilizam o SUS sem ressarci-lo. A discriminação não se limita ao acesso, à existência de portas diferentes para a entrada no hospital. Ela se estende aos cuidados médicos, aos cuidados de enfermagem e ao tipo de hotelaria ofertado a esses diferentes pacientes.

Os hospitais contratados/conveniados pelo SUS devem cumprir as determinações constitucionais e infraconstitucionais (Lei 8.080). E a Constituição e a Lei 8.080 são claras neste aspecto, não deixando margem a interpretações: deve ser “garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde”.

Por último, não me espanta a decisão, uma vez que ela é tomada pela mesma Corte (ou por parte dela) que há poucas semanas atrás decidiu que a tortura é equivalente a crime político e, portanto, passível de anistia, contrariando um entendimento universal de que essa prática é inaceitável em qualquer regime ou sistema social do mundo.
*MÉDICO SANITARISTA