quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Mais um exemplo

Mais um exemplo do descaso com a saúde pública. A usuária do SUS Ana Campo enviou ao blog esse relato, de acontecimento ocorrido na última semana, demonstrando que o governo Fogaça não dá a mínima para o interminável problema das filas, além de permitir tratamento desumano aos cidadãos:

Hoje 04:30

Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça, desgraça, que a gente tem que tossir

Hoje, 4:30 da manhã me dirigi ao Posto de Saúde Modelo da capital para chegar na fila em tempo de conseguir lugar que me garantisse adquirir ficha para atendimento com clínico geral a fim de tratar uma infecção urinária. Havia lá gente desde 02:30 h, sem novidades... Boa parte das pessoas que moramos nesta renomada capital já assimilamos mecanismos dos mais variados para driblar a escuridão da madrugada, o gelo de julho (não é que doença gosta do frio gaúcho?) e alguma contingência qualquer e, nessa rotina a solidariedade derivada, quem mora perto busca café para todos, quem traz jornal volta sem ele, quem fica guarda lugar de quem sai mas volta, quem tem horas diz, quem sabe informa, quem não ajuda não atrapalha. Mas já havia dado no jornal e aconteceu, choveu. Uma forte chuva desabou o céu às 05:20 em Porto Alegre.

Na foto do celular umas pessoinhas molhadas, de longe, nada perto do que se vê por aí - crianças horas a fio em filas de hospitais, velhos terminais sem vaga para internação, alguns médicos-deuses com o “destino” das pessoas nas mãos porque ALGUN$ meteram as mãos nos recursos, de tudo. Mas dando um zoom, lá estavam : Angela Maiato, Libero Maiato, Neli Campidelli, Margarida De Jesus, Elisabete Borba, Jorge Lopes Goulart, Júlio Plínio Teixeira, Ariovaldo Medeiros, Marta Quintana Mandatare, Danilo Batista Vieira, Ramão Padilha, Eloina Flores, Julio Cabral, Paulo Diehl, Maria Idalina, Rosalina da Silva, Osmar Teixeira, Williams Monteiro, Ivone dos Santos, Nair da Silva, Antonio Oliveira, Lígia Castro, Renildo Moura, Neli Cabral, Thales Prado, Zilca Gollo, Beatriz Limberguer, Lisandro Suslia, Luis Alves, Neusa R,. Santos, Ana Campo.

Aquelas tinham 70, uma 77, outro um marca-passo, eu não poderia molhar-me, ninguém poderia molhar-se. Mas o guarda responsável pela segurança do posto negou-se a acolher-nos no local alegando orientação superior. -Tudo bem amigo, entendemos, entre em contato com seu superior e aja rápido, pois os velhos estão ensopando. Foi negada a abertura do saguão, desta vez não entendemos.

Adentrar madrugadas para garantir um serviço público e universal já é no mínimo ultrajante quando sabemos que o dinheiro de todos e de cada um é desviado, transviado e qualquer coisa que se possa imaginar - que se tolere esta situação como única possibilidade para conseguir assistência não naturaliza ou dignifica este estado de coisas – ser deixad@s na chuva intensa e ter o acesso negado a um estabelecimento público esgotou a paciência de tod@s, só a paciência, pois continuamos molhados até 07:20 hora em que se abriram as portas.

Registrei queixa junto à administração do posto e à Prefeitura de Porto Alegre, que deveria propiciar estrutura e orientação aos postos evitando a gladiação entre usuári@s e funcionári@s, temos direito a não padecer cada vez que seja necessária utilização do serviço, qualquer argumento terrorista que minimize o fato extrapolando a bárbara realidade da saúde pública na cidade, no Estado e no país, não atenua o senso de dignidade e respeito que, sabemos, merecemos em tudo.

Ana Campo

terça-feira, 10 de novembro de 2009

No Blog do Juremir

No Blog do Juremir

Nossas ponderações sobre o SUS (com o mesmo conteúdo, mas com forma diferente do Artigo que foi publicado na ZH) foram publicadas pelo Juremir Machado da Silva, em seu Blog do Correio do Povo na edição de 09-11-2009.

Clique aqui para ver.

domingo, 8 de novembro de 2009

Caravana em Defesa do SUS: “todos” não defendem o SUS.

Nesta próxima sexta-feira, dia 06 de novembro, chega ao nosso Estado a “Caravana em Defesa do SUS”, cujo tema central é “TODOS EM DEFESA DO SUS”.

A escolha desse tema suscita dúvidas e preocupações que, sem a pretensão de esgotar o assunto, gostaria de abordar nesse artigo.

Em primeiro lugar é importante que se defina quem são “todos” que defendem o SUS e, em segundo lugar, afinal, de qual SUS estamos falando?

Será que os “todos” incluídos no tema central da Caravana têm os mesmos interesses e defendem uma mesma concepção de SUS?

Em minha opinião, caso “todos” inclua o conjunto dos setores e classes representadas em nossa sociedade, essa hipótese, a da defesa comum do SUS, não se sustenta.

O SUS que os trabalhadores e setores médios da sociedade defendem e necessitam é substancialmente diferente do SUS que o empresariado que “investe” na área da saúde defende e quer.

O SUS que interessa a imensa maioria da população brasileira (os 80% que dele dependem diretamente) é um SUS universal, integral, de qualidade e executado diretamente pelo Estado. É um SUS onde o Estado deveria assumir diretamente a responsabilidade pela produção de “todos” os insumos, equipamentos e serviços que dizem respeito ao complexo industrial da saúde e, ao mesmo tempo, assumir a responsabilidade pela prestação direta desses mesmos serviços. É um SUS onde a presença do setor privado é residual, tal como determina a Constituição Federal.

O SUS dos empresários é um outro tipo de SUS.

É um SUS que vive de incentivos, subsídios, filantropias e benesses patrocinadas pelo Estado, com os recursos dos impostos retirados dos trabalhadores.

É um SUS que oferta atendimento diferenciado, de acordo com as posses de cada cidadão. É um SUS que discrimina desde a porta de entrada da instituição até a prestação dos serviços, sejam eles quais forem. É um SUS que vive das terceirizações, da precarização dos contratos de trabalho e da apropriação de locais de trabalho pertencentes ao Estado em benefício próprio.

Nós somos defensores incontestes do SUS universal e executado diretamente pelo Estado.

A manutenção da bandeira do “Todos em Defesa do SUS”, que se recusa a enxergar a existência de interesses opostos na construção do SUS, configura-se em um equivoco irreparável, que contribui para perpetuar a situação de abandono em que se encontra a população que dele depende.

Lucio Barcelos

Médico Sanitarista
Artigo publicado em Zero Hora, no dia 06/11/2009. Clique aqui para ver.