quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Artigo publicado na Edição da Zero Hora do dia,
09 de outubro de 2013 | N° 17578

ARTIGOS

Fraudes contra o SUS, por Lucio Barcelos*

No dia 6 de março do ano em curso, o diretor financeiro e de planejamento da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre informou, em matéria publicada pela jornalista Maria Isabel Hammes, do Informe Econômico da Zero Hora, que 65% dos atendimentos daquela instituição são utilizados pelos usuários de planos privados de saúde e, portanto, apenas 35% dos leitos são utilizados pelos usuários do SUS.

Só para lembrar, o complexo hospitalar da Santa Casa opera, há muitos anos, com um Certificado de Filantropia. Daí decorre que 60% dos atendimentos de “todos os serviços da Santa Casa” deveriam ser fornecidos ao Sistema Único de Saúde. Informei essa discrepância (para não dizer safadeza) ao Ministério da Saúde. Nenhuma providência foi tomada. A clientela da Santa Casa deve continuar a ser de 65% ou mais de portadores de planos privados, sonegando os atendimentos ao SUS. Importante ressaltar que os hospitais filantrópicos (ou pilantrópicos), ao receberem o certificado de filantropia, assumem o compromisso de atender 60% de sua capacidade pelo SUS, e o restante para planos privados. E para isso deixam de pagar impostos e tributos, reduzindo seus custos em até 30%.

Uma ressalva. Não são todos os hospitais que funcionam dessa forma. Existem alguns que respeitam as normas do SUS.

Segundo, pode ser que, para o Fantástico e para a imprensa em geral, as falcatruas contra o SUS sejam uma novidade. Mas, para quem trabalha na área, esse sistema fraudulento sempre existiu e o Ministério da Saúde não possui estrutura fiscalizatória para coibir esses fatos.

A chamada cobrança por fora ou o preenchimento de AIHs fraudulentas fazem parte do sistema desde que ele foi constituído.

Terceiro, os hospitais privados e/ou filantrópicos recebem, além da tabela formal do Sistema Único, “incentivos” para cada especialidade que eles atendem. Só que eles omitem esse “pequeno” detalhe, para se fazer de explorados.

Particularmente, sou da opinião de que os hospitais filantrópicos deveriam ser “desapropriados” por interesse público. Seria uma medida saneadora do sistema. E acabaria com essas falcatruas que prejudicam e penalizam a população usuária do SUS, que são aproximadamente 150 milhões de brasileiros que não têm acesso a planos privados de saúde. Mesmo os mais simples e de menor custo. Que na verdade são atravessadores de pacientes. Uma vez numa instituição hospitalar, os custos vão para o SUS. E, para variar, sem o ressarcimento devido. Como sempre.
*Médico sanitarista