terça-feira, 18 de janeiro de 2011

18 de janeiro de 2011 - Seção Artigos ZH

Ladeira abaixo, por Lucio Barcelos*

Com a mesma periodicidade que se repetem as tragédias, catástrofes e devastações, proporcionalmente de maior responsabilidade dos homens do que da natureza, repetem-se os apelos à necessidade urgente de os governantes debruçarem-se sobre aspectos relacionados ao planejamento, à qualificação da gestão e à tomada de medidas de prevenção.

Porém, constata-se que nada acontece. As catástrofes continuam, em escala cada vez mais ampliada, e as medidas de planejamento e qualificação da gestão, que, supõe-se, resolveriam os problemas, não se materializam. Creio que é hora de a sociedade se perguntar se o centro dos problemas está em um melhor planejamento e melhor gestão ou se os problemas estão localizados em outra esfera. Caso me perguntassem, eu responderia que os problemas estão situados em outra área.

Não se trata apenas de ações, medidas ou propostas de planejamento ou de melhorar a gestão dos governos atuais. Antes de qualquer coisa, trata-se de opções políticas tomadas pelo Estado. Essas opções determinam para quem se planeja e se faz gestão. O Estado brasileiro, pelo que se vê, faz muito tempo que planeja para atender os interesses particulares de grupos empresariais, financeiros e corporativos. Nesta equação, os interesses da imensa maioria da população não estão em questão.

Resulta no que resultou e vem resultando há muitas décadas. Tragédias sobre tragédias, sem uma solução aparente e sem definição de responsabilidades. Morrem mais de 500 cidadãos, cidades são devastadas, milhares perdem todos os seus bens e todos vão para os meios de comunicação para manifestar seu pesar pelos acontecimentos e o quanto da responsabilidade cabe à natureza ou a imprevidência dos “outros”. Nunca de si mesmo.

A imprensa divulgou dados da ONG Contas Abertas que mostram que foram utilizados apenas 39% dos recursos federais disponíveis no Programa de Prevenção e Preparação para Desastres, estimados em R$ 425 milhões. A alocação desses recursos mostra que havia o entendimento de que era necessário “prevenir” e “planejar” antecipadamente, destinando recursos para os municípios onde a catástrofe se mostrou mais dramática.

Deve, portanto, haver explicações de outra natureza para o não uso desses recursos. Suponho que o Contas Abertas, assim como outras entidades que defendem os interesses da maioria da sociedade, ingresse com algum tipo de representação junto ao Ministério Público Federal, cobrando o não uso, que se revelou criminoso, desse montante de recursos.

*Médico sanitarista

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