Em sua edição do dia 01 de maio, ZH publicou uma extensa matéria intitulada “Referência Nacional: Gestão do Clínicas vira modelo”, onde o Hospital de Clínicas de Porto Alegre, é apresentado como possível modelo para os demais 46 hospitais universitários existentes no país, por conta da Medida Provisória 520/2010 que, salvo melhor juízo, tem por objetivo exterminar com o pouco de público que resta no Sistema Único de Saúde, criando a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A.
É mais ou menos a mesma coisa que tratar a saúde da população, com os mesmos parâmetros que utilizamos para montar uma fábrica de rapaduras.
O Hospital de Clínicas é uma instituição pública. Não nos interessa sua figura jurídica. Ele vive, come e dorme, às expensas do dinheiro do contribuinte. Quando falamos em saúde, a discussão preliminar, que necessariamente temos que fazer, é se a saúde é um bem público, portanto um direito universal, sem discriminação de qualquer natureza, cujo acesso deve ser igual para todos, ou se a saúde é um bem regulado pelas leis do mercado, onde o que vale é o poder aquisitivo, e o acesso aos serviços é regulado pelo poder de compra de cada um. De meu ponto de vista, não tenho a menor dúvida que saúde é um bem público, portanto um dever do Estado.
É bom que se diga que, de um orçamento de R$ 579 milhões, míseros 6% (R$ 32 milhões) são provenientes do uso indevido de 102 leitos para pacientes provenientes de planos privados de saúde. São leitos e recursos usurpados da população que paga para manter as instalações físicas, paga os salários de todos os funcionários, paga a compra de equipamentos, insumos e medicamentos, paga e sustenta, enfim a estrutura inteira da instituição. É por essas e outras, que no Clínicas subsiste a famigerada “dupla porta”, onde aos pobres se oferta o sofrimento de dias de espera na emergência e aos remediados é permitido o acesso direto, através dos nem sempre muito confiáveis Planos Privados de Saúde. Que, é bom lembrar, não ressarcem o SUS quando utilizam os serviços do mesmo.
Caso o Hospital necessite de maior aporte de recursos financeiros para pesquisa e compra de medicamentos, tenho a absoluta convicção de que o Ministério da Saúde e o MEC, uma vez provocados, aportarão esses recursos ao Hospital de Clínicas, sem que ele tenha que passar pela vexatória situação de ter que justificar o atendimento de pacientes privados em uma instituição pública para receber R$ 32 milhões.
Agenda memória: em 21 de janeiro de 2009, portanto há dois anos e três meses, o Ministério Público Federal, ingressou com uma Ação Civil Pública contra o Hospital de Clínicas, buscando que ele cumprisse a CF e as leis, dedicando a integralidade de seus leitos e procedimentos médicos ao SUS. Até o momento, passados esses dois anos e três meses, a Justiça Federal ainda não se pronunciou. Já não era tempo?
Lucio Barcelos – Médico Sanitarista
Diretor Geral do Hospital Psiquiátrico São Pedro
Maio de 2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário