Na matéria em questão os entrevistados são os candidatos ao cargo de Prefeito de Porto Alegre e as perguntas são as seguintes: “O que o senhor faria para reduzir as filas nos postos de saúde da capital?” e “o que será feito para diminuir o tempo de espera para consultas, exames e cirurgias especializados, pelo Sistema Único de Saúde?”.
O que chama a atenção, em primeiro lugar, é que nenhum dos candidatos, da esquerda para a direita ou vice-versa, toca no elemento essencial do problema que afeta o SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE, qual seja: a saúde é um direito dos cidadãos e como tal deve ser tratada. Cabe ao Estado prover saúde, assim como educação e saneamento, para o conjunto da população, sem intermediários de qualquer espécie, privados ou não.
A Constituição Federal é clara nesse aspecto: O sistema de saúde é público e complementarmente privado. Então, se trata de mudar o modelo de sistema que existe na nossa realidade. Hoje, 70% do sistema de assistência à saúde brasileiro é privado. No Rio Grande do Sul 86% dos leitos hospitalares são privados. Com o agravante de que o sistema público, via de regra, trabalha a favor do sistema privado e de que o sistema privado vive às custas de subsídios, os mais variados, fornecidos pelo setor público. O Estado brasileiro não possui - porque não é do interesse dos grandes grupos transnacionais - nenhum laboratório público de produção de medicamentos e muito menos de fabricação de equipamentos para a área da saúde. O ensino, da mesma forma, está voltado para o mercado e não para resolver os problemas evidenciados pelo perfil epidemiológico da população. A realização de concursos públicos é uma exceção. A contratação de pessoal se dá, em sua imensa maioria, por entes privados (Fundações, OSCIPS, OS, etc). Em Porto Alegre, 100% dos postos da Estratégia Saúde da Família são terceirizados. É admissível uma coisa dessas na área de atenção básica? Obviamente não, mas ninguém diz nada.
No varejo, todos os candidatos apresentam propostas semelhantes. A chamada esquerda, dando um tom um pouco mais “desprivatizante” e de uso do recurso público de uma forma mais efetiva. As soluções propostas não questionam a estrutura ou o modelo de sistema existente, e as soluções ficam no terreno de alternativas “gerenciais”. Melhorar a gestão, informatizar, ampliar a atenção básica, aplicar mais recursos financeiros, etc., etc., etc.
Em verdade, ou nós transformamos o sistema atual através de uma ampla mobilização social, fazendo-o um sistema efetivamente público, sem qualquer interferência privada, com um financiamento decente, com concursos públicos e salários dignos, ou vamos continuar por mais algumas décadas falando, de mudanças gerenciais, muito necessárias, mas que não alteram a “alma” – e, consequentemente, não eliminam os problemas – do sistema. Ele pode até ficar um pouco melhor (o que duvido muito), mas continuará servindo ao mesmo patrão: os interesses privados e não os interesses da população.
Lucio Barcelos - Médico Sanitarista
Agosto de 2012
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